O sono não é simplesmente desligar-se do estado de vigília, consiste em um estado ativo no qual inúmeras funções e processos da fisiologia do organismo mantêm um metabolismo intenso. É possível analisar esses processos de diversas formas, desde a simples observação comportamental até a medição de variáveis fisiológicas dos diversos sistemas do organismo. (1)
Nesse contexto, há os distúrbios do sono, sendo o mais frequente a Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) que consiste em distúrbio caracterizado pela obstrução e colapso das vias aéreas superiores que impossibilitam a ventilação normal durante o sono. Dessa forma, pode-se levar à apneia quando cessa o fluxo de ar ou a hipopneia quando apenas há redução desse fluxo aéreo. (2)
Diante disso, foi desenvolvido um exame para diagnóstico das alterações do sono, sobretudo das alterações respiratórias como a apneia obstrutiva do sono, denominado polissonografia (PSG). Esse exame refere-se a um processo sistemático utilizado para coletar parâmetros fisiológicos durante o sono, inicialmente era realizado apenas em laboratórios de centros de medicina do sono, onde saturação de oxigênio; fluxo aéreo oronasal; movimento respiratório; eletroencefalograma (EEG); posição do corpo; miograma (EMG); eletro-oculograma (EOG) e eletrocardiograma (ECG) são gravados. Consiste em um método altamente preciso, porém há desvantagens, como a necessidade de o paciente permanecer uma noite no laboratório do sono e a presença de um técnico ser essencial; além disso, é um processo lento e de alto custo tornando-se inacessível a uma grande parcela da população. (2,3)
Com o avanço tecnológico tem sido possível uma redução do tamanho dos equipamentos de monitorização com o registro dos dados da noite toda no próprio aparelho, assim transformando-os em portáteis. Possibilitando, portanto, o monitoramento dos pacientes em suas casas, denominado como polissonografia domiciliar, esses novos dispositivos ainda usam menos sensores que um PSG, são mais confortáveis e, geralmente, são automáticos. (2,4)
Para a compreensão da polissonografia domiciliar, é essencial compreender os aparelhos polissonográficos. Como existe uma diversidade dos sistemas polissonográficos houve a necessidade de classifica-los de acordo com os seus níveis de resolução, assim a PSG varia do nível I ao IV. A nível I, denominada como polissonografia padrão-ouro assistida, é capaz de registrar EEG; EOG; EMG, utilizando no mínimo de sete canais. Com relação ao nível II, conhecida como polissonografia portátil, é definida com os mesmos parâmetros do nível I, contudo não exige pessoal treinado para supervisão. Já o nível III, sistema portátil modificado para o diagnóstico da SAOS, capaz de oferecer no mínimo quatro canais incluindo ventilação (pelo menos dois canais para movimentos respiratórios, ou movimento respiratório e fluxo aéreo oronasal). ECG ou frequência cardíaca e saturação de oxi-hemoglobina; nesse nível avalia-se apenas as variáveis cardiorrespiratórias. (5)
O nível IV, registro contínuo de um ou dois parâmetros. Nesse caso, inclui um oxímetro simples associado ou não ao registro de frequência cardíaca, contudo a reduzida sensibilidade ou especificidade têm limitado o uso do oxímetro no diagnóstico da SAOS. Além disso, esse dispositivo é capaz de gravar um ou dois canais. (2,5)
No ambiente domiciliar há o teste da apneia do sono em casa (HSAT) é uma alternativa ao PSG no diagnóstico de SAOS. Esse método é utilizado apenas para a avaliação da SAOS em pacientes não complicados e com risco moderado a alto de possuir essa patologia e que não tem condições médicas comórbidas. Não é recomendado em pacientes com faixa etária superior a 65 anos, visto que os pacientes idosos que moram sozinhos podem possuir dificuldade em aplicar os sensores corretamente, além disso os indivíduos com índice de massa corporal > 40kg apresenta risco aumentado da síndrome de hipoventilação da obesidade. (3)
Vale destacar que os estudos de titulação CPAP não podem ser realizados usando HSAT. Com relação aos critérios de exclusão são: doença cardiorrespiratória significativa, insuficiência cardíaca congestiva ou doença pulmonar obstrutiva crônica; potencial fraqueza do músculo respiratório, devido patologias neuromusculares; uso crônico de opioides; risco para hipoventilação da obesidade; curso recente; insônia grave; sintomas de outros distúrbios do sono e razões ambientais ou pessoais que podem levar a problemas de interpretação dos resultados. (3)
Os dispositivos HSAT geralmente usam o mesmo tipo de sensores usado em PSG, contudo do tipo III e IV, apresentando menos sensores totais e o EEG não é gravado. Os mais comuns são do tipo III, mas há outros com a possibilidade de sensores estendidos além dos tradicionais dessa classe. Dessa maneira, quando essa tecnologia foi utilizada nos contextos clínicos apropriados, não demonstrou ser inferior que a PSG. (3)
Referente as limitações desse método relacionam-se, sobretudo, com à gravidade da SAOS ser subnotificada, pois esses dispositivos não medem o sono ou excitações do EEG durante o sono, e dessa forma o tempo total de gravação é considerado igual ao total de horas dormidas, o que geralmente não condiz com o caso. (3)
Um dos dispositivos utilizados para o exame é o polissonígrafo Alice Night One, fabricado pela Philips Respironics. Assim, na maleta contém o aparelho, juntamente com um cinto de esforço; embalagem com a cânula nasal; módulo da oximetria e o manual do fornecedor, contendo as instruções necessárias para a colocação adequada, utilizando também recursos ilustrativos. É um método todo automatizado, que após os posicionamentos corretos dos sensores, basta verificar no aparelho se o sinal mudou a coloração de vermelho para verde. Vale ressaltar, que todos os sensores necessitam estar verdes para o funcionamento do dispositivo e, posteriormente, fornecer um diagnóstico mais fidedigno. (6)
Para a realização da polissonografia domiciliar é fundamental que a empresa que fornece esse serviço demonstre de forma a ensinar e solucionar as dúvidas dos pacientes em relação a correta aplicação em domicílio. Com relação ao preparo do exame sendo realizado em um centro ou em casa, é recomendado que não administre nenhum medicamento para dormir, bebidas alcoólicas ou com cafeína antes do teste, pois podem interferir no sono. O exame é realizado durante o período de uma noite e após esse prazo os registros são analisados por um especialista. (7,8)
As indicações para a solicitação desse exame domiciliar são: sonolência diurna; ronco alto; períodos de pausas na respiração observada por terceiros, seguidos por engasgos e sono inquieto. Por outro lado, é contraindicada quando o indivíduo apresentar um estado gripal; quadro febril ou qualquer condição clínica que possa interferir nos parâmetros avaliados pelo exame, como quadros infecciosos, respiratórios agudos, dermatites e dores; ainda é contraindicado após viagem que haja mudança de fuso horário e gestantes com mais de 34 semanas de gestação. (8,9)
Quando esse exame é realizado na residência do paciente apresenta inúmeros benefícios como: redução do efeito já mencionado pela literatura médica e denominado como efeito de primeira noite em laboratório do sono, este que é descrito como a dificuldade de iniciar e manter o sono em um ambiente laboratorial; outra vantagem está relacionada a maior acessibilidade, uma vez que consegue abranger pacientes apresentam condições que o impossibilita de ir ao centro de medicina do sono. (5)
Portanto, visto que a polissonografia domiciliar é um exame que visa o diagnóstico de distúrbios do sono, sobretudo, da Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono, é fundamental que o indivíduo ao perceber alterações na qualidade ou quantidade do sono, procure avaliação de um profissional qualificado, entre eles o neurologista, para que haja uma investigação individual. É importante ressaltar que distúrbios como a SAOS é fator de risco para diversas patologias sistêmicas, como acidente vascular cerebral e infarto, por isso a importância de um diagnóstico precoce, para posteriormente haver uma conduta terapêutica adequada e específica para cada paciente. (10)
REFERÊNCIAS
1. Bustamante GDO. Monitorização polissonográfica – Aspectos gerais. Medicina (B Aires). 2006;39(2):169–84.
2. Mendonça F, Mostafa SS, Ravelo-García AG, Morgado-Dias F, Penzel T. Devices for home detection of obstructive sleep apnea: A review. Sleep Med Rev [Internet]. 2018;41:149–60. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1087079217301338?via%3Dihub
3. Rundo JV, Downey R. Polysomnography. Handb Clin Neurol [Internet]. 2019;160(1877):381–92. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/B9780444640321000254?via%3Dihub
4. Zancanella E. Sleep home monitoring: a technical option! Braz J Otorhinolaryngol [Internet]. 2013;79(3):266. Available from: https://www.redalyc.org/pdf/3924/392437928002.pdf
5. Guimarães GM. Diagnóstico Polissonográfico. Pulmão RJ. 2010;19(22):88–92.
6. Respironics P. Alice NightOne – Manual do fornecedor [Internet]. 2015. Available from: http://images.philips.com/is/content/PhilipsConsumer/Campaigns/HC20140401_DG/Documents/Manual do Fornecedor.pdf
7. Duarte RL de M. Métodos Resumidos no Diagnóstico da Apnéia do Sono . 2010;19:78–82. Available from: http://www.sopterj.com.br/wp-content/themes/_sopterj_redesign_2017/_revista/2010/n_03-04/05.pdf
8. Médica E. Polissonografia [Internet]. 2018. Available from: https://medlineplus.gov/spanish/ency/article/003932.htm
9. Einstein HIA. Polissonografia Domiciliar [Internet]. 2015. Available from: https://www.einstein.br/especialidades/neurologia/exames-tratamentos/polissonografia-domiciliar
10. Duarte RL de M, da Silva RZM, da Silveira FJM. Complicações e conseqüências da apnéia obstrutiva do sono. Pulmão RJ [Internet]. 2010;19(3–4):73–7. Available from: http://www.sopterj.com.br/wp-content/themes/_sopterj_redesign_2017/_revista/2010/n_03-04/04.pdf